quarta-feira, 14 de agosto de 2019

MEMÓRIA DE MINHA INFÂNCIA





MEMÓRIA DE MINHA INFÂNCIA

Uma memória da infância, das mais belas e prazerosas, aparece na foto que ilustra este relato. Meus pais levaram a Norma e a mim, para passear no Cerro de Montevideo. Fomos de piquenique, com comida fria preparada pela mamãe. Lembro das milanesas crocantes, douradas, dentro de fatias de pão caseiro, com grossas rodelas de tomate americano bem maduro, bem vermelho, suculento e com sal. Lembro da alegria de compartilhar o almoço, com a família unida, rindo, conversando e festejando o momento mágico.
Do Cerro, à margem do Rio da Prata para o sudeste, víamos toda a cidade, a baia, o porto com grandes navios e o prédio da aduana. Para o sudoeste, o Cerro desce até quase às águas do rio, e assim se formam pequenas praias de areias branquinhas muito finas, com manchas coloridas de pequenos barcos de pescadores, que naquela época (aproximadamente no ano de 1952/53) tinham suas vilas muito perto.
Alguns salgueiros “chorões” botavam na paisagem seu encanto verde, de longe em longe, espaçados... descendo para a prainha, ainda no Cerro, muita pedra, muito canto rodado, que juntávamos para brincar. Papai nos fez olhar para o topo do Cerro, e lá tinha uma construção branca, de grandes rochas na base, o Forte, monumento histórico que fazia voar nossa imaginação. Lembro que papai me falou que dali se vigiava a chegada dos navios e que antigamente havia canhões para a defesa da capital.
Eu achava meu pai muito bonito, e acreditava que ele sabia de tudo. As gaivotas sobrevoavam o Rio da Prata, e uma grande ave passou perto de nós. Ele gostava de nos ensinar sobre os mistérios da natureza, e um dos temas que lhe fascinava, era a época dos dinossauros. Vendo a gaivota, disse-me que ela, muito tempo antes, tinha um antecessor chamado “Pterodáctilo”, com asas de couro, sem penas, enorme, com um bico gigantesco. Eu era uma menina curiosa, sonhadora, e logo imaginei aquele animal esquisito da pré-história. Rimos muito, tanto minha irmã como eu tentando repetir o nome do bicho. Ele deu uma gargalhada sonora que fez eco na altura, e nos dando uma mão a cada uma, foi nos cuidando amorosamente para não cair na descida do Cerro.
Mamãe era sempre a fotografa da família. Tinha uma maquinha preta, como uma pequena caixa, que usava com excelente resultado. Ela adorava registrar momentos da vida da família, e rindo, pediu a papai para deter-se, e ela descer um pouquinho para fazer uma foto desse momento inolvidável, quando vimos pela primeira vez que as aves se originaram daqueles répteis voadores. Papai nos parecia um sábio... mamãe tirou essa foto tão linda dele conosco, suas filhinhas, Moñita e Deita.
Finalizamos o passeio à tardinha, devorando “pasteis folhados”, recheados de goiabada, que mamãe fazia como ninguém, e nos refrescando com um copo de coca cola. Eles dois tomavam chimarrão amargo, para contrastar com a doçura dos pasteis. Assim, guardo na memória afetiva esta foto de nosso passeio ao Cerro de Montevideo, de nosso lindo e sabido pai, e das iguarias que mamãe preparava para deleite de todos nós.
Esqueci de dizer que ela tinha feito esses vestidinhos preciosos que vestíamos, com florezinhas e rendas de cor celeste o de Moñita, e com cerejas estampadas, o meu, e que ela tinha forrado com linha de seda vermelha, umas bolinhas de madeira, imitando cerejas, que pendiam de um cordãozinho verde. Eu adorava ver o movimento das cerejinhas de madeira. Este vestido foi um dos que mamãe me fez e que nunca esquecerei.
Minha irmã Norma e eu, tivemos uma infância feliz, graças a Deus, e a eles dois. Que o Senhor lhes guarde juntos, como tanto desejaram...

Dea Coirolo Copyright
14/08/2019
Gravatá - PE